segunda-feira, 30 de maio de 2011

Uma obra...

"A coisa mais difícil que existe no mundo é acabar uma obra. No começo é aquele entusiasmo, aquela alegria. O dia passa rápido e, na hora de dormir, só se deseja uma coisa: que o amanhã seja ainda melhor do que hoje, cheio de novidades e de descobertas. De que estávamos falando, de um casamento ou de uma obra? Não importa, é quase a mesma coisa – com todo o respeito. A primeira parede derrubada é um sonho, de tão bom. Sai o sofá, sai a mesa e, no dia em que sai a cama, é como uma lavagem cerebral. Ah, daqui pra frente, tudo vai ser diferente – com a ajuda de Deus. Chega a hora de escolher os revestimentos. O banheiro vai ser de que cor? Uma jacuzzi ou uma banheira normal? A sala vai ter que combinar com seu atual estado de espírito, é claro. Em tons dramáticos ou do tipo clean? Cheia de objetos ou totalmente despojada?
Já sabendo que é sujeita a mudanças, é bom não jogar nada fora. Mande embalar e ponha no sótão do sítio de alguma amiga, porque já sabe: no próximo ano pode querer mudar tudo de novo – e essa é a graça. Os meses passam e um dia você acorda cansada. Aquele cheiro de poeira já não é mais tão delicioso, e ter que passar por cima do entulho para chegar à cozinha... Bem, existem maneiras mais agradáveis de viver. Mas vai ter que ir até o fim, pois obra é uma das poucas coisas no mundo que não se pode abandonar; o dinheiro está no fim, só que precisa continuar. Raspa a poupança – é para isso que ela existe – e tudo bem. Só que a paciência vai acabando, a casa não fica pronta e tem que tomar 500 decisões por dia. “A senhora vai querer a tomada de telefone da sala em que lugar?” Difícil saber se ainda nem decidiu onde vai colocar o sofá. É de matar, e o eletricista está em pé na sua frente esperando a resposta. Resolve; provavelmente mal, mas resolve, e as coisas vão andando. Até que o chefão da obra comunica que está tudo pronto. Aí, então, começa a segunda etapa. O chão de mármore, que havia sido polido por um alto especialista, está imundo e arranhado. Suas lindas plantas estão respingadas de tinta. O cinto preto de St. Laurent, que custou 500 euros, onde está? E a pulseira do Marrocos? Só faltou procurar no freezer.
O controle remoto sumiu, aquele anel que deixou dentro do cinzeiro desapareceu, o telefone sem fio está sem a base. Olha e vê os preciosos CDs dentro de um saco de lixo de plástico azul; já iam saindo com o último entulho, ai, meu Deus. Ao abrir os armários, que deixou trancados, vê os cabides, que são pretos, cobertos de poeira, daquela bem grossa; imagine os vestidos. Mas, quando estiver tudo no lugar, o vinho na geladeira, as flores no vaso e os amigos dizendo que ficou lindo, você vai estar tão feliz que vai esquecer do drama que é uma obra – e sentir que valeu a pena. Não se espante se, daqui a dois anos, abrindo uma revista de decoração, der vontade de começar tudo de novo. Seja corajosa e vá em frente, pois são as mudanças que fazem com que a vida seja sempre surpreendente."

Danuza Leão.

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